Quer saber como? Quebrando tabus e capacitando os profissionais para identificarem fatores de risco. Neste Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio as palavras de ordem são: respeito, acolhimento e empatia. A Femerj apoia a campanha Setembro Amarelo pela valorização da vida!
Natália Oliveira
O suicídio está entre as 20 maiores causas de morte no mundo entre pessoas de todas as idades, sendo claramente um problema de saúde pública mundial. Mas por que falar disso é tão difícil? Por que parece uma realidade tão distante? Falar de suicídio é um tabu, rodeado de estigmas. De acordo com a Cartilha desenvolvida pela a Associação Brasileira de Psiquiatria – ABP, em parceria com o Conselho Federal de Medicina – CFM em 2014, primeiro ano da campanha Setembro Amarelo, erros e preconceitos vêm sendo historicamente repetidos a respeito das doenças mentais e dos comportamentos suicidas.
96,8% dos casos de pessoas que atentam contra a própria vida envolvem transtornos mentais como depressão, transtorno bipolar e abuso de substâncias, doenças que também são marginalizadas pela sociedade. Segundo a OMS, a prevenção do suicídio continua sendo um desafio universal. Ao todo, no mundo, são registrados mais de 800 mil casos por ano. No Brasil, são 12 mil suicídios todos os anos. Os números mostram o quanto é importante falarmos abertamente do tema. Essa triste realidade pode ser evitada se cada um de nós e o Estado fizerem sua parte.
Segundo o Centro de Valorização da Vida (CVV), as razões que podem levar uma pessoa a pensar em suicídio são inúmeras e bem diferentes. Segundo estudo realizado pela Unicamp, 17% dos brasileiros, em algum momento, pensaram seriamente em dar um fim à própria vida e, desses, 4,8% chegaram a elaborar um plano para isso. A psicóloga Karen Athié, superintendente de Atenção Psicossocial e Populações Vulneráveis da SES-RJ, lembra que é importante saber que uma pessoa em risco de suicídio precisa realmente de ajuda e que além do apoio pessoal é necessário o encaminhamento aos serviços especializados.
Mas, como posso ajudar?
A OMS afirma que o suicídio é resultado de uma convergência de fatores de risco genéticos, psicológicos, sociais, culturais e outros, às vezes combinados com experiências de trauma e perda. “Pessoas que tiram a própria vida representam um grupo heterogêneo, com influências únicas, complexas e de várias facetas. Essas diferenças representam desafios para os especialistas em prevenção, que sugerem uma abordagem em vários níveis”.
Apesar da diversidade dos motivos, é possível enumerar e identificar fatores de risco que podem indicar que alguém pode estar tendo pensamentos suicidas. No dia a dia, entre amigos, familiares, colegas de trabalho, devemos ficar atentos a frases como:
- “Vou desaparecer.”
- “Vou deixar vocês em paz.”
- “Eu queria poder dormir e nunca mais acordar.”
- “É inútil tentar fazer algo para mudar, eu só quero me matar.”
De acordo com o Ministério da Saúde, as pessoas sob risco costumam falar sobre morte e suicídio mais do que o comum, confessam se sentir sem esperanças, culpadas, com falta de autoestima e têm visão negativa de sua vida e futuro. Essas ideias podem estar expressas de forma escrita, verbal ou por meio de desenhos. É importante que saibamos ouvir, sem julgar.
Isolamento, mudanças marcantes de hábitos, perda de interesse por atividades que gostava antes, descuido com aparência, piora do desempenho na escola ou no trabalho, alterações no sono e no apetite também podem indicar que a pessoa está precisando de ajuda.
Nesses casos, às vezes um olhar atento, um ombro amigo, uma simples conversa salvam vidas. Pensamentos e sentimentos suicidas podem ser insuportáveis, tornando muito difícil saber o que fazer para superá-los. Não hesite em ajudar. Seguem algumas dicas de como agir:
- Encontre um momento apropriado e um lugar calmo para falar sobre suicídio com essa pessoa. Deixe-a saber que você está lá para ouvir, ouça-a com a mente aberta e ofereça seu apoio.
- Incentive a pessoa a procurar ajuda de profissionais de serviços de saúde, de saúde mental, de emergência ou apoio em algum serviço público. Ofereça-se para acompanhá-la a um atendimento.
- Se você acha que essa pessoa está em perigo imediato, não a deixe sozinha. Procure ajuda de profissionais de serviços de saúde, de emergência e entre em contato com alguém de confiança, indicado pela própria pessoa
- Se a pessoa com quem você está preocupado(a) vive com você, assegure-se de que ele(a) não tenha acesso a meios para provocar a própria morte (por exemplo, pesticidas, armas de fogo ou medicamentos) em casa.
- Fique em contato para acompanhar como a pessoa está passando e o que está fazendo.
Você conhece o CVV?
Se você está precisando conversar e não sabe com quem, ligue 188. O Centro de Valorização da Vida (CVV) oferece apoio emocional 24 horas por dia de forma gratuita. Você será atendido por um voluntário com todo o respeito, sigilo e anonimato que você precisa. Você também pode entrar em contato pelo Chat, email ou comparecer em um dos postos do CVV.
Mesmo se estiver na dúvida, clique aqui e escolha como se sente mais à vontade para conversar.
Se você conhece alguém que precise de ajuda indique a central de atendimento, que atualmente conta com cerca de 4 mil voluntários, em mais de 120 pontos do país. O CVV é uma das ONGs mais antigas do país e os voluntários estão preparados para conversar com quem precisar falar sobre sentimentos, dores, descobertas, dificuldades e alegrias. O Centro de Valorização da Vida registra cerca de 3 milhões de atendimentos por ano.
Qual é o papel dos profissionais de saúde nessa luta?
O Setembro Amarelo busca, além de desmistificar o tabu em torno do suicídio, conscientizar as pessoas de que uma sociedade engajada faz toda a diferença em defesa da vida. Como já falamos, o suicídio é uma grave questão de saúde. Por isso, a OMS defende que o problema deve ser abordado também do ponto de vista científico e de política públicas. Este ano, pela terceira vez, o Dia Mundial de Prevenção do Suicídio (10/09) foi dedicado à mostrar a importância de trabalharmos juntos.
Segundo a Associação Brasileira de Psiquiatria, o suicídio é uma emergência médica e a avaliação sistemática dos riscos deve fazer parte da rotina clínica das unidades de saúde. 80% das pessoas que morreram vítimas de suicídio foram a uma consulta médica, não psiquiatra, um mês antes de tirarem a própria vida e metade delas seis meses antes chegou a procurar ma unidade de saúde.
“É possível prevenir o suicídio, desde que, entre outras medidas, os profissionais de saúde de todos os níveis de atenção, estejam aptos para reconhecerem os fatores de risco presentes, afim de determinarem medidas para reduzir tal risco e evitar o suicídio”- ABP. Muitas vezes, o primeiro contato de uma pessoa que está com a intenção de cometer um suicídio com o sistema de saúde não acontece através de um especialista, como um psiquiatra, por exemplo. Geralmente, essas pessoas procuram pronto-socorros, UPAs, ou médicos de atenção básica.” – ABP
Reconhecer o risco nesses pacientes e abordá-los de forma correta é fundamental. Para isso, é preciso que os profissionais sejam capacitados. Segundo a ABP, a tentativa prévia de suicídio e a presença de transtornos psiquiátricos não tratados ou mal curados são os dois principais fatores de risco para identificar um paciente como possível suicida.
Conheça mais fatores de risco na Cartilha “Suicídio – Informando para prevenir”
A OMS identifica três características psicopatológicas comuns em quem comete tentativas de suicídio: a ambivalência, a impulsividade e a rigidez. Além disso, existe uma distorção da percepção da realidade com uma avaliação negativa de si mesmo. O funcionamento mental gira em torno de três sentimentos: do intolerável, do inescapável e do interminável.
A avaliação de pacientes com indícios de que podem cometer suicídio precisa ser feita de forma rotineira, pois a gravidade do risco pode mudar rapidamente. É necessário fazer entrevistas clínicas constantes não só com o próprio paciente, mas também com amigos e parentes.
É importante que os profissionais de saúde tenham consciência de todos os fatores de risco e das características que combinadas podem levar a um diagnóstico de que o paciente está com a ideia tirar a própria vida. A partir daí, médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem devem agir, sabendo ouvir e transmitir àquele paciente sentimentos de alívio e acolhimento. Ter uma rede de saúde bem integrada, capacitada para a prevenção do suicídio é essencial para proteção e valorização da vida.