Aproveitando a campanha Janeiro Branco, a Femerj explica como a pandemia afetou a saúde mental da população. O coordenador de atendimento psicossocial da SES, Daniel Elia dá dicas sobre como se cuidar em meio a esse turbilhão que estamos vivendo e destaca o papel da informação para mantermos o equilíbrio.
Natália Oliveira
O mês de janeiro está acabando. E você? O que fez para cuidar da sua saúde mental? A Campanha Janeiro Branco estimula a população a incluir nas metas do novo ano que começa o cuidado diário com a mente em todos os lugares: em casa, no trabalho, nas relações familiares e sociais. De acordo com o coordenador de atendimento psicossocial da Secretaria de Estado de Saúde do Rio, Daniel Elia, a saúde mental é uma linha que atravessa toda a expansão da vida humana. Todo problema físico impacta no psicológico e vice versa. “A saúde mental está em tudo”, afirma Daniel, reforçando que negligenciá-la é um grande risco para o ser humano.
Tudo que vivemos e a maneira que encaramos as coisas refletem na nossa saúde como um todo. Diferente do que muitos podem pensar, a definição de saúde não é ausência de doença. A OMS conceitua a saúde como um completo estado de bem-estar: físico, mental e social.
Um relatório emitido pela Fiocruz, explica que um indivíduo está bem quando consegue perceber suas próprias habilidades, enfrentar situações estressantes comuns nas rotinas diárias e ser capaz de ter uma vida ocupacional produtiva. Esse estado de bem-estar pode ser afetado por situações cotidianas, independente da pessoa sofrer ou não com alguma doença psíquica. As pressões internas e externas, conflitos de relacionamentos, perdas, o desemprego, tudo isso impacta a saúde mental.
A pandemia do novo coronavírus trouxe graves consequências para a saúde mental da população em todo o mundo. O luto fez surgir e agravou estados de depressão, ansiedade e outros transtornos mentais. Além disso, o isolamento social fez com que muitas pessoas ficassem longe das famílias, das pessoas que ama e transformou rotinas. Os idosos, que geralmente já sofrem com a solidão, foram muito impactados pela necessidade da quarentena. E os profissionais de saúde que atuam na linha de frente no combate à Covid-19, sofrem com a exaustão causada por essa guerra travada contra a doença. De acordo com uma pesquisa realizada pela Fiocruz, sintomas de ansiedade e depressão afetam 47,3% dos trabalhadores de serviços essenciais durante a pandemia no Brasil e na Espanha.
Com o lema “Todo Cuidado Conta”, a 8ª edição da campanha Janeiro Branco, busca promover em 2021 um pacto pela saúde mental em meio a esse turbilhão que estamos vivendo a quase um ano.
Quais as consequências da pandemia para a saúde mental das pessoas?
Especialistas consideram os problemas relacionados com a saúde mental como uma “quarta onda” da pandemia da Covid-19. Neste caso, a divisão em ondas não estaria ligada à curva de contágio, mas ao impacto da pandemia nos sistemas de saúde. A primeira onda seria a pandemia em si, o início do contágio; a segunda, o colapso do sistema com a lotação dos leitos e falta de equipamentos; a terceira estaria relacionada tanto aos impactos econômicos e sociais, quanto ao agravamento de doenças crônicas. Essas ondas acontecem simultaneamente e não uma após a outra.
Segundo a OMS, a pandemia interrompeu serviços essenciais de saúde mental em 93% dos países do mundo. Ao mesmo tempo, a procura por esses serviços aumentou. Pesquisas da Fiocruz mostram que de um terço e metade da população exposta à uma epidemia, pode vir a sofrer alguma manifestação psicopatológica.
O luto, o medo, o isolamento social e a perda de renda foram alguns dos principais motivos que levaram os brasileiros a procurarem ajuda em 2020. Mas, em cada momento da pandemia, as queixas foram diferentes. Desde o medo do desconhecido e a dúvida sobre a capacidade de se adaptar, até as questões internas de autoconhecimento que surgiram com o isolamento.
De acordo com a Fiocruz, a própria mudança da rotina habitual contribui para o desencadeamento de reações e sintomas de estresse, ansiedade e depressão, como o aumento da ocorrência de distúrbios do sono e o abuso de substâncias psicoativas. O importante é que as pessoas não negligenciem essas reações e fiquem atentas a si mesmas. Reações como sentimento de impotência, irritabilidade, solidão, tristeza, raiva, desamparo e angústia podem ser comuns neste momento. Porém, dependendo da intensidade e combinação desses sentimentos, as consequências para a saúde podem ser graves.
Caso a pessoa perceba que estas reações estão causando sofrimento é importante que procure ajuda especializada. A expressão “não aguento mais” é um bom sinal para percebermos o momento em que não estamos conseguindo lidar sozinhos com o problema. É preciso quebrar o estigma que gira em torno da saúde mental. Buscar ajuda não é sinônimo de fraqueza e sim de força, de vontade de lutar pelo próprio bem-estar. Ter consciência dos próprios limites é um aprendizado diário, que faz toda diferença no cuidado com a saúde mental.
O coordenador de atendimento psicossocial da Secretaria de Estado de Saúde do Rio, Daniel Elia, destacou que além do autoconhecimento, da busca por hábitos saudáveis e atividades que tragam bem-estar, durante a pandemia é essencial que as pessoas estejam bem informadas.
“É importante entender que a pandemia está sendo um momento difícil para todo mundo. As pessoas precisam confiar nas soluções da ciência, respeitar, seguir as orientações de especialistas e entender que só assim sairemos dessa situação. Nesse momento as confusões criadas por fake news prejudicam e dão a sensação de estarmos perdidos’, explicou o coordenador.
Daniel, que também é psicólogo, lembrou ainda da importância das conversas e da troca cotidiana. Para isso, cada um de nós deve fazer a sua parte, sabendo ser um bom ouvinte, acolhendo, respeitando a dor do outro e evitando julgamentos. Sobre a chegada da vacina, o coordenador voltou a reforçar a importância da informação, da ciência e da empatia. Ele disse que o momento é de esperança, mas também de sermos pacientes e esperarmos a nossa vez, sem cair na cilada de uma ansiedade coletiva.
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O que a SES fez para lidar com essa quarta onda?
A Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro tomou algumas medidas para tentar abrandar essa quarta onda da pandemia no estado. Daniel Elia explicou que no início da quarentena, com a criação do call center para informações sobre a Covid pelo 160, foram identificadas várias demandas relacionadas à saúde mental. A partir daí, psicólogos foram designados para acompanharem esses atendimentos e quando necessário fazer o encaminhamento para a rede psicossocial dos municípios, para Cruz Vermelha ou para UERJ..
Além disso, a SES ampliou o debate com os municípios sobre os impactos da pandemia na saúde mental da população fluminense e organizou a partilha de experiências que estavam tendo resultados positivos. Alguns municípios do Rio se estruturaram para dar suporte psicológico aos profissionais de saúde que atuam na linha de frente, por exemplo. Outros conseguiram se organizar para realizar atendimento domiciliar aos pacientes graves que já realizavam tratamentos de saúde mental na rede e que por conta da pandemia não estavam conseguindo acessar os equipamentos.
Daniel Elia lembrou que o orçamento para investimento em saúde mental no Brasil é muito baixo e reforçou a importância do Estado perceber que o cuidado com a saúde mental tem impactos econômicos e sociais. “Os gastos públicos com saúde mental hoje são baixíssimos quando olhamos para o orçamento destinado à saúde como um todo. Precisamos entender que é uma questão social primordial, olhar com carinho para a área e investir”, enfatizou o coordenador de atendimento psicossocial.