Estado do Rio não tem projeto de acolhimento de pessoas com deficiência desabrigadas

A Ação Vicente Moretti, em Bangu, tem desempenhado esse papel por quase 60 anos, abrigando adultos com deficiências severas de famílias carentes ou que foram abandonados. Conheça o trabalho desta instituição sem fins lucrativos e saiba como ajudar.
Natália Oliveira

Neste Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência há muito o que se comemorar, mas, ao mesmo tempo, muito para refletir e cobrar. A Lei Brasileira de Inclusão, aprovada em 2015, reforçou o direito da pessoa com deficiência ao pleno exercício da liberdade, da igualdade e da cidadania. Apesar de todas as legislações aprovadas, a sociedade ainda está recheada de uma série de preconceitos, que acabam aumentando os desafios daqueles que têm qualquer deficiência física ou mental no nosso país.

Para Fábio Peluso, diretor da Ação Cristã Vicente Moretti, afiliada à Femerj, que atua no acolhimento e atendimento da pessoa com deficiência, as leis são muito importantes, mas é preciso que haja uma mudança na cultura. “Tem todo um movimento favorável hoje na luta contra qualquer tipo de preconceito. As pessoas têm que entender que todos nós, de alguma forma, temos alguma deficiência e passar a olhar o outro como igual, apesar das diferenças”, afirma Fábio.

A Ação Vicente Moretti, localizada em Bangu, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, preenche uma lacuna deixada pelo Estado e que muitas vezes é um tabu mesmo entre os movimentos que lutam pela pessoa com deficiência: o abrigo de adultos com deficiências severas. Apesar da legislação orientar que não deveria ter uma institucionalização das pessoas com deficiência, ainda vemos muitas dessas pessoas sendo abandonadas e não tendo a quem recorrer. Não há nenhum projeto no município ou no estado do Rio que dê abrigo ou disponibilize recursos para esse acolhimento.

“Entendemos a política da não institucionalização da pessoa com deficiência, mas recebemos muitos pedidos de abrigamento de famílias que tem pessoas com deficiências severas e que, devido a limitações financeiras não conseguem cuidar delas em casa. É claro que o ideal seria que essas pessoas fossem acolhidas em seus próprios lares, mas isso nem sempre é possível e está muito condicionado à renda dessas famílias. Dependendo do grau da deficiência, são necessários muitos cuidados e atenção integral”, contou Fábio.

O diretor da associação reforçou que, em 2021, a Vicente Moretti completa 60 anos e que é um desejo de todos que a atuação da instituição pudesse se restringir ao atendimento hospitalar, às oficinas de entretenimento e ao Centro de Reabilitação, mas isso ainda não é possível. Segundo ele, a sociedade precisa lutar pela criação de um programa de acolhimento para adultos com deficiência. Há iniciativas na área da saúde, mas falta pensar na questão social desses indivíduos, que acabam ficando muito vulneráveis. Fábio afirma que a associação recebe todos os dias pedidos de ajuda:

“Nós gostaríamos muito de atuar apenas como hospital e centro de reabilitação realizando um atendimento apenas durante o dia, de segunda sexta. Mas ainda há a necessidade de acolhimento e abrigamento, principalmente de adultos com deficiências severas, que a família não consegue dar conta sozinha dos cuidados que eles exigem. Por não haver um programa público nesse sentido, a Vicente Moretti cumpre esse papel, tentando sobreviver mesmo com os altos custos. Nós temos hoje pelo menos 28 residentes acamados, que não falam, não conseguem levantar, cuidar da sua própria higiene. É uma tarefa que exige muitos profissionais e pessoas qualificadas e com a sensibilidade necessária para esse trabalho. Estamos inclusive tentando parcerias na área social para equilibrarmos nossas contas”, explicou Fábio.

Atualmente, a Vicente Moretti abriga 40 residentes no Hospital, que precisam de cuidados médicos prolongados, e 14 residentes no Abrigo Institucional, que acolhe pessoas com deficiências físicas e intelectuais mas brandas. Fora isso, a associação oferece oficinas de música, artesanato, terapia ocupacional, passeios, entre outras atividades que promovem o entretenimento não só para os abrigados na instituição, mas também para frequentadores. Cerca de 120 pessoas hoje participam dessas ações que acontecem em média três vezes por semana.

Enfermeiros, médicos, terapeutas, equipes de portaria, limpeza e serviços gerais trabalham para manter a associação funcionando 24 horas por dia, oferecendo um ambiente de amor e cuidados. A Vicente Moretti também conta com um Centro de Reabilitação, que atende em média 400 pessoas por mês. Os serviços de reabilitação são divididos em duas áreas: saúde e terapias. Lá as pessoas com deficiência podem ser acompanhadas, por exemplo, por neurologistas, psiquiatras, clínicos gerais, fonoaudiólogos, psicólogos, fisioterapeutas, nutricionistas e ainda podem fazer acupuntura e pilates. São 100 profissionais hoje na instituição, mais os voluntários que permitem que todo esse trabalho aconteça.

FONOAUDIÓLOGA DENISE CARDOSO COM O INTERNO MICHEL FRANCO

A Ação Vicente Moretti é uma associação sem fins lucrativos, desde que foi fundada em 1961. Atualmente, 30% dos recursos da instituição vem de doações de empresas e pessoas físicas. Fora isso, a associação tem um convênio com o SUS para os atendimentos hospitalares e tem uma clínica popular, mas que segundo Fábio Peluso, tem uma atuação limitada devido ao preconceito das pessoas com os residentes.

Saiba como ajudar a Ação Vicente Moretti

Como dissemos anteriormente, grande parte dos recursos que fazem com que a associação continue de portas abertas vêm da solidariedade. Existem duas plataformas, que estão disponíveis no site da Ação Cristã Vicente Moretti, para que as pessoas possam fazer doações de recursos. Quem quiser colaborar com a instituição pode se tornar um associado e contribuir através do pagamento de boletos mensais no valor desejado, ou participar da “Vaquinha Online” que tem sido essencial para o pagamento, por exemplo, das contas de água e luz da associação que todo o mês ficam em torno de R$ 15 mil reais. Qualquer doação é muito bem vinda!

Outra forma de ajudar é através da doação de alimentos perecíveis e não perecíveis, de fraldas geriátricas, luvas de procedimentos e produtos de limpeza e higiene. Os materiais podem ser entregues direto na associação ou a pessoa pode entrar em contato com a Vicente Moretti para combinar da própria instituição buscar as doações. O contato pode ser feito pelo telefone (21) 2401-9533 ou através do whatsapp: (21) 99149-3181. Sempre terá alguém disponível para fazer o atendimento e tirar dúvidas.

Quem quiser ser voluntário também pode entrar em contato e saber como fazer se inscrever. A associação sempre está precisando de profissionais de saúde, cuidadores sociais e pessoas para as áreas de recreação, logística, almoxarifado e administração.

“A pandemia da Covid-19 trouxe alguns desafios. O maior deles foi a dificuldade de interação, tão necessária para os nossos residentes. As visitas tiveram que ser proibidas e muitos deles acabaram ficando deprimidos. Nosso trabalho teve que ser ainda mais intenso, com as nossas equipes tentando preencher essa lacuna. Entretanto, em relação aos nossos recursos, tivemos uma melhora. Aumentaram os números de doações. Houve uma onda de solidariedade, com um apoio muito grande principalmente ao nosso hospital. Recebemos muitas doações tanto de recursos financeiros, quanto de alimentos nesse período. Isso é muito importante para a gente”, concluiu Fábio Peluso, diretor da associação.

A Femerj parabeniza à Ação Vicente Moretti pelo lindo e tão necessário trabalho realizado e neste Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência pede a colaboração de todos para ajudar instituições como essa a continuarem protegendo e lutando pelas parcelas mais vulneráveis da nossa população.